A Ética do Analista e o Sigilo Profissional
Implicações Jurídicas e Legais, publicado no JUSBRASIL
Dr. Zilmar Ferreira Freitas
9/17/20254 min read


A ética do analista, especialmente no âmbito da Psicanálise, encontra respaldo não apenas nos princípios éticos da prática clínica, mas também no ordenamento jurídico brasileiro. O sigilo profissional é condição indispensável para o exercício da análise, pois garante a proteção da intimidade, da privacidade e da dignidade da pessoa humana — valores estes tutelados pela Constituição Federal (art. 1º, III e art. 5º, X).
A confidencialidade estabelece a base da relação entre analista e analisando, permitindo a livre expressão e a partilha de informações íntimas necessárias ao processo analítico. A quebra injustificada do sigilo configura grave violação ética e pode gerar consequências legais severas, de ordem cível, penal e administrativa, conforme a legislação vigente.
Contudo, o direito ao sigilo não é absoluto. Em situações excepcionais, como em casos de ameaça séria e iminente à vida ou à integridade de terceiros, o analista poderá ser compelido a limitar o dever de confidencialidade, sempre de forma proporcional e restrita ao necessário, conforme orienta o art. 5º, caput, da Constituição e princípios de razoabilidade e proporcionalidade aplicados pelo Judiciário.
Princípios Fundamentais
Confidencialidade incondicional: O analista deve manter absoluto segredo sobre a identidade e os relatos de seus analisandos, em conformidade com o art. 154 do Código Penal, que tipifica como crime a revelação de segredo em razão de função, ministério, ofício ou profissão.
Construção da confiança: O sigilo profissional é requisito indispensável para a criação de um vínculo terapêutico sólido, baseado na confiança e no respeito mútuo, reconhecido como essencial pela jurisprudência brasileira em temas que envolvem a relação paciente-profissional.
Proteção da dignidade: O sigilo preserva a dignidade e a vida privada do indivíduo, direitos fundamentais assegurados pelo art. 5º, X, da Constituição Federal e pelo art. 21 do Código Civil.
Condutas Vedadas ao Analista
Compartilhar informações com terceiros: O art. 9º do Código de Ética Profissional do Psicólogo (Resolução CFP nº 010/2005) já veda a revelação de informações obtidas em atendimento, salvo em situações previstas em lei. O mesmo se aplica ao psicanalista que, mesmo não regulamentado em conselho específico, deve observar princípios éticos análogos.
Nem a familiares, amigos e outros profissionais, conforme lemos código de Ética da Sociedade Psicanalítica Miesperanza: O Psicanalista não deve comentar sobre pacientes, mesmo com pessoas de sua intimidade, como esposa, filhos, etc., assim como não pode comentar casos de pacientes com outros pacientes mesmo com a intenção de encorajá-los, pois isto tanto foge da técnica, quanto amedronta ao paciente.
Exposição em eventos científicos: A apresentação de casos clínicos em palestras, congressos ou aulas exige anonimização rigorosa, sendo obrigatório o uso de pseudônimos, mesmo havendo consentimento expresso do analisando.
Exibição da identidade: Não é permitido identificar, direta ou indiretamente, o analisando como paciente em qualquer espaço público ou privado.
Exceções e Limites do Sigilo
Graves ameaças à vida: Conforme entendimento consolidado na doutrina jurídica, o dever de sigilo pode ser relativizado diante de ameaça concreta a direitos fundamentais, como a vida e a integridade física. Nesses casos, aplica-se o princípio da proteção à vida, que prevalece sobre o sigilo, mas sem afastar o dever de restrição mínima da informação.
Autorização expressa: Para utilização de relatos em contextos acadêmicos ou científicos, é imprescindível a autorização escrita do analisando, em observância ao art. 7º, I e III da LGPD ( Lei Geral de Proteçâo de Dados – Lei 13.709/2018), garantindo o consentimento informado e a proteção de dados pessoais sensíveis.
Supervisão clínica: Discussões em supervisão são admitidas, desde que respeitado o anonimato e, preferencialmente, com ciência do analisando.
Responsabilidades do Analista
Prudência nas anotações: Caso realize registros escritos, a ter cuidado absoluto garantindo que ninguém delas tome conhecimento e o analista deve utilizar pseudônimos ou códigos, protegendo o material contra acessos indevidos, conforme estabelece a LGPD quanto à guarda e tratamento de dados sensíveis, bem como está incluído no Código de ética da Sociedade Psicanalítica Miesperanza.
Respeito à história e a identidade do analisando: O respeito à subjetividade, cultura e identidade do paciente decorre diretamente do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88).
Consequências legais: A quebra do sigilo pode ensejar:
Responsabilidade civil, por violação de direitos da personalidade – indenização por danos morais e materiais (arts. 186 e 927 do Código Civil);
Responsabilidade penal, crime de revelação de segredo, nos termos do art. 154 do Código Penal;
Responsabilidade administrativa, podendo implicar processos éticos e disciplinares em conselhos profissionais ou associações, quando aplicável.
✅ Em síntese, o sigilo profissional na Psicanálise não é apenas uma questão ética, mas uma exigência jurídica e constitucional, com proteção expressa em normas de direito civil, penal e constitucional. Sua observância é imperativa para resguardar a integridade do processo analítico e para evitar implicações legais severas ao profissional.
Referências Jurídicas
BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988.
BRASIL. Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002).
BRASIL. Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940).
BRASIL. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 ( Lei Geral de Proteçâo de Dados – LGPD).
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução CFP nº 010/2005 – Código de Ética Profissional do Psicólogo.
SOCIEDADE PSICANALITICA MIESPERANZA. Código de Ética Profissional.